2 de junho de 2003

BEING OUT OF MY WORLD
Ainda sobre as coisas que nos passam ao lado, escreve a Vera Martins:
"Estive estes dias em Coimbra. Fui com o propósito do Direito e Justiça no séc. XXI, Colóquio Internacional, fui meio escondida. Estava lá o Presidente, a Ministra e especialistas internacionais em Justiça.

Descobri através do contacto com gajos esclarecidos da interioridade que nós, lisboetas, somos odiados pelo resto do Portugal. A sério que não desconfiava porque frequento muito o minho e o alentejo. Mas estes que conheci são os que têm de vir e de ir no intercidades para ver umas coisas clássicas na Gulbenkian...não são as modistas e os lavradores com quem costumo conversar.

A sério que fico triste: eles sabem que levamos uma vida esfuziante de merda e odeiam-nos por termos as exposições, os lançamentos, e todos os concertos de grande qualidade capazes de atenuar a vida de merda que levamos. A sério que estou confundida. Chamam-nos"convencidamente limitados". Porra, ainda bem que não acreditavam que eu era uma verdadeira lisboeta".

Este assunto faz-me lembrar as confusões via correspondência que tinha quando fui morar para os Açores, na minha adolescência. Volta e meia via-me embrulhado em discussões que derivavam de alguma coisa que um dos meus amigos, ou eu próprio, escrevíamos e a que a distância tinha adulterado. É difícil para quem está nos centros de decisão entender o que se passa no outro extremo do país. Sabe-se lá o que é que a vizinhança de uma vila transmontana diz entre si sobre a forma como o governo deveria administrar o Estado. E vice-versa: como é que se pode esperar que alguém que mora para lá de Silves ou do Marão entenda que não é fácil viver em Lisboa, no meio da confusão, da poluição e da competição desenfreada? Facilmente se imagina que a capital é um pomar em que basta estender a mão para colher os frutos. Não é. Ou não teríamos cada vez mais gente a dormir nos vãos de escada, enrolados em caixas de papelão...
O que está a acontecer é a distorção provocada pela lente da distância.

Sem comentários: